Se há algo de positivo na onda de intolerância que temos
verificado recentemente, seja no relativo protecionismo das redes sociais ou
na evidente exposição das ruas, é que o Brasil está, mesmo que aos poucos,
saindo do armário. Não me refiro somente aos homossexuais que se assumem para
si mesmos ou publicamente. Mas principalmente àqueles que sempre preferiram,
por algum tipo de comodismo, manterem-se em cima do muro e que agora começam a
demonstrar suas posições de forma mais clara.
Desde o advento das mídias sociais as opiniões se
recrudesceram. Os que sempre tiveram suas “pequenas” homofobias do dia-a-dia
(coisas como “isso tem que ser feito só entre quatro paredes” ou “com o meu
filho isso não acontece porque não falta educação”) passaram a sentirem-se mais
aptos a destilarem seus ódios, independentemente do fundamento. E os que sempre
foram simpatizantes à causa começam a abandonar o silêncio e demonstrar seu
apoio, realizando uma autêntica onda de respeito à individualidade humana.
Minha mãe, sábia que é, sempre me disse: “não cuspa para
cima porque cai na cara”. Lembro da primeira vez que ela me falou isso; foi
quando eu, com meus seis, sete anos, fiz alguma piadinha sobre um menino ser “viado”.
Perguntei o que ela quis dizer com aquilo e ela contou que eu não sabia o dia
de amanhã; que eu poderia ter um filho que seria hostilizado da mesma forma ou
mesmo que passasse pela mesma questão sexual. Acabou que aconteceu justamente
uma geração antes a cusparada metafórica a que ela se referia...
O processo de sair do armário para um gay pode ser comparado
ao de ficar careca: é muito pior enquanto você está no processo. Depois que
você aceita que é um caminho sem volta, raspa tudo e assume a calva definitiva,
tudo fica mais fácil. Até porque aquele É você. Não, eu não sou careca – e
espero não ser no curto prazo. Mas já ouvi o sofrimento de amigos que passaram
por isso.
É difícil acreditar que alguém ainda pense que ser gay é uma
mera questão de “pouca vergonha” ou uma “opção”. Para muitos gays, se assumir,
principalmente para si mesmo, passa por muito sofrimento. Negação, medo de
decepcionar, medo de ser abandonado. É uma fase tenebrosa na maioria das vezes,
que pode envolver agressões (físicas e verbais), expulsão de casa e até
assassinatos.
Não, não é uma opção. Opção é viver ou não dentro do
armário. E por mais que convivamos em uma sociedade ainda intolerante e muitas
vezes agressiva, agradeço por presenciar esse momento de transformação. Em que as
pessoas estão tomando seus partidos. Em que só vejo amor nas postagens que
coloco sobre o meu relacionamento. Em que mais de uma centena de pessoas foi ao
meu casamento para simplesmente celebrar o amor entre dois seres.
O Brasil está saindo do armário. E espero que nunca mais
volte.
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Paulo Henrique Brazão, nosso colunista oficial das quartas-feiras, é niteroiense, jornalista e autor do livro Desilusões, Devaneios e Outras Sentimentalidades. Recém chegado à casa dos 30 anos, não abre mão de uma boa conversa e da companhia dos bons amigos.
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Um comentário:
Concordo com vc! se a homofobia ganhou espaço nas redes sociais as afirmações e as defesas tb ganharam, todo mundo de um jeito ou de outro teve que sair do armario, ou para se demonstrar preconceituoso ou para se mostrar defensor das pessoas! Excelente texto!
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