Estou assistindo com certo atraso (ok, seis anos para ser
mais preciso) à primeira temporada da série americana Glee. Já havia muito
tempo que tinha os boxes de DVDs em casa, mas foi de alguns meses para cá que
parei para assistí-los. Além do meu gosto por musicais, o que causa empatia
inicial com a série (que é muito bem feita, tem bons vocais e ainda nos dá a
oportunidade de apresentar com um novo significado músicas que cantávamos com embromation
acompanhando o rádio no passado), existe algo de fantástico em Glee que é a
constante mensagem de “seja quem você é”.
Existem lá diversos estereótipos presentes: o professor de
música que torce para que os seus alunos tenham mais sucesso do que ele teve; a
treinadora insuportável das cheerleaders (a melhor personagem da série); o
treinador de futebol americano sem qualquer tipo de vaidade; a orientadora
educacional cheia de TOCs; a aluna que se acha Barbra Streisand e acredita ser
melhor do que todos os demais colegas; o boa praça que é capitão do time de
futebol americano e se torna líder do grupo musical; as bitches e os bad boys
que começam a se redimir após o contato com os losers e veem que, na verdade,
não são tão diferentes assim – e aqueles que não mudam mesmo e continuam ameaçando
fisicamente. E ainda há o adolescente gay que passa pelo momento da aceitação
do pai bronco e, ainda assim, luta por vezes contra a sua sexualidade para
tentar provar algo para esse mesmo pai.
Esses estereótipos só fazem sentido porque são a realidade.
Numa sociedade como a norte-americana, baseada no sistema de vencedores e
perdedores, de heróis imediatos, de busca por holofotes, essas figuras se
repetem de forma cíclica em qualquer canto do país. Não precisamos ir muito
longe: situações como bullying e apartheid por popularidade são realidade em
muitas instituições brasileiras. Eu mesmo já tratei disso aqui ao falar de comoo colégio no qual passei 11 anos da minha vida mais parecia um high schoolestadunidense. Identifico várias figuras dessas acima por lá.
Mesmo com tudo isso, muitas das vezes são as adversidades
que nos mostram a nossa verdadeira essência. No único momento em que fiz
terapia em minha vida, lembro-me do psicólogo recorrer a uma frase de Jesus
(não, ele não estava tentando converter ninguém) que dizia “E conhecereis a
verdade e a verdade vos libertará”. Em nenhum momento ele disse que a verdade
seria única. Mas, sim, que cada um deveria conhecer a sua própria verdade. Porque
viver na mentira é uma prisão eterna e que causa sequelas irreparáveis.
Sempre tive muito problema em decepcionar as pessoas. Esse
foi o grande cerne da tal terapia que mencionei acima. Curioso é que por pelo
menos duas vezes em minha vida tive que tomar decisões que poderiam desapontar aqueles
que eu mais amava à época: quando assumi a minha sexualidade e ingressei na
minha religião. Costumo dizer que ambas não foram escolhas, mas, sim,
descobertas. Escolha seria viver numa hipócrita mentira que me garantisse a
aceitação fácil da família e da sociedade, mas que me mataria por dentro.
Sei que Glee perde fôlego nas temporadas futuras. Inclusive, assistir agora às cenas de Lea Michele com Cory Monteith gera certa melancolia
ao saber que o rapaz já faleceu (na idade em que eu estou hoje, diga-se de
passagem). Mas Glee cumpriu sua função enquanto existiu. Certamente ajudou
diversos adolescentes (e adultos) a se entenderem melhor. E a seus pares a
saberem como lidar com situações que fogem do seu controle – afinal, a felicidade
e a personalidade dos outros é algo individual e intransferível. Rachel, Finn,
Will, Sue, Quinn, Puck, Mercedes, Santana, Kurt e cia terão sempre um espaço
guardado na história da dramaturgia americana. E nos meus tempos livres nos
próximos meses.
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Paulo Henrique Brazão, nosso colunista oficial das quartas-feiras, é niteroiense, jornalista e autor do livro Desilusões, Devaneios e Outras Sentimentalidades. Recém chegado à casa dos 30 anos, não abre mão de uma boa conversa e da companhia dos bons amigos.
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Um comentário:
Não assisti toda a série mas é divertido.
"Porque viver na mentira é uma prisão eterna e que causa sequelas irreparáveis." Realmente é algo que estou superando aos poucos...
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