Respirar. Algo tão essencial à vida que fazemos
involuntariamente, mesmo dormindo, mesmo desmaiados. Quando pequeno, achava
graça em prestar atenção na própria respiração, pra saber se em algum momento,
por um lapso, meu corpo me trairia e pularia a hora de inspirar. E achava mais
graça ao ver que isso nunca acontecia e que, mesmo se eu “me esquecesse”, iria
continuar respirando.
Era tão automático respirar que eu sequer imaginava que
fazia isso mal. A grande mudança veio no último dia 30 de outubro, quando
realizei a primeira cirurgia da minha vida: correção do desvio de septo.
Procedimento simples, mas com pós-operatório chato, que desde a adolescência eu
sabia que precisava fazer, porém, empurrava com a barriga por não se tratar de
uma emergência. Em 2015, após três sinusites seguidas e depois de começar a
estacionar nos exercícios físicos (em especial na corrida, que era meu esporte
favorito, e na qual já sobrecarregava o meu coração), resolvi que era chegada a
hora.
A operação em si foi bem tranquila, em menos tempo do que o
programado. O medo da primeira cirurgia existia; estava nervoso devido à
anestesia geral, embora buscasse passar o contrário aos que estavam à minha
volta. Em 45 minutos tudo correu bem e estava de volta ao quarto do hospital. Minha
primeira pergunta ao abrir os olhos foi: “Eu estou com tampão no nariz?”. Fui
informado pela enfermeira que não. Ali puxei o ar pela primeira vez e senti uma
enorme diferença. Mais quatro dias se passaram e retirei os drenos. Mais ar.
Fiz um tratamento para curar uma rinite que apareceu no caminho. Uma vez
curado, mais ar.
O repouso foi absoluto durante 10 dias e, para exercícios,
mais de 30 dias. A recuperação não foi fácil: há muito sangramento, inchaço,
dor. Mas vale muito a pena. Retomei a academia, ainda sem as corridas, há cerca
de duas semanas. E é muito curioso como é tudo diferente. Uma atividade simples
que você achava que fazia bem, mas acabava respirando pela boca, agora é
facilmente feita puxando o ar pelas narinas. Não há mais determinadas tonturas
e vertigens que sentia no meio dos exercícios ou mesmo ao me levantar do chão.
A pulsação nos aeróbicos não extrapola a ideal para a minha idade, fato que
acontecia a todo o momento antes, mesmo quando eu estava super treinado.
Comentando na academia que era muito bom poder respirar, de
fato, entre alteres, supinos e outros aparelhos, ouvi a seguinte pergunta: “Como
você respirava antes?”. Sabe que eu não sei responder a essa pergunta direito?
Lembro que o ar passava com dificuldade; às vezes para fazer coisas simples,
como beijar, não era fácil. Mas não sentia, exatamente, que algo me faltava,
que não estava pleno. Se não fosse a indicação médica, provavelmente nunca
saberia que tinha um problema operável.
Isso me fez refletir sobre tantas pequenas coisas que não
aproveitamos na plenitude em nossas vidas, talvez por não saber como elas
deveriam ser, na verdade. A liberdade de alguém que sempre viveu preso; o amor
de alguém que nunca foi retribuído; o relacionamento de alguém que sofre
agressões e/ou humilhações; o trabalho de alguém que não descobriu a sua
vocação; a infância de uma criança que nunca pôde brincar. Como saber como é a
vida com essas coisas se nunca a tiveram?
Por enquanto, estou aproveitando as delícias de redescobrir
uma coisa tão simples, como respirar. Brinco que estou me afogando em tanto ar
que eu nem sabia que existia. Mas daqui a algum tempo, será tão normal quanto
era antes e sequer lembrarei que isso um dia foi um problema. Espero que nunca
me acostume com tudo aquilo que de medíocre possa acontecer em minha vida, mesmo
que não tão essencial quanto o oxigênio que nos cerca.
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Paulo Henrique Brazão, nosso colunista oficial das quartas-feiras, é niteroiense, jornalista e autor do livro Desilusões, Devaneios e Outras Sentimentalidades. Recém chegado à casa dos 30 anos, não abre mão de uma boa conversa e da companhia dos bons amigos.
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