Oi, Momo. Tudo bem? Nós não somos chegados muito um ao
outro, eu sei. Não é de hoje, inclusive, essa nossa relação estremecida. Não
gosto muito de blocos, não gosto de ter milhares de pessoas suadas à minha
volta fritando no sol, não curto gente bêbada nem no individual (quanto mais em
aglomeração), não ligo para marchinha (embora um dos romances que esteja
escrevendo seja inspirado nisso) e, talvez por não vir de uma família católica,
não via o Carnaval como um período de liberação extrema e quase que necessária
após um longo período de 40 dias de penitências até a Páscoa.
Pra mim, Momo, é difícil entender toda essa magia que existe
em torno do seu período. Ou pior: que já domina os fins de semana, às vezes, mais
de um mês antes da folia chegar. Admito que olho para as fotos dos meus amigos
em redes sociais já pulando Carnaval previamente, muitos secos para irem de
bloco em bloco como abstêmios de uma droga, como se não houvesse amanhã, e
penso: “caramba, e eu doido para esta num ar condicionado agora!”. Lembro-me de um meme que simulava uma
manifestação popular e num cartaz havia escrito (em uma montagem clara): “Stop
Early Christimas Decorating”. Eu logo imaginava algo como “Stop Previous
Carnival Celebrating” quando via toda essa comoção antecipada.
Assumo que já pensei até em postar coisas sobre nas redes
sociais. E vi que, sim, estaria sendo um chato regulador. Não tenho problemas
em ser reconhecido como chato, desde que a minha chatice diga respeito a mim;
mas não estou a fim de entrar na liberdade do outro de fazer o que ele quiser
com a hora vaga dele. E até acho que esse amor excessivo dos outros por você é um pouco
sintomático, sabia, Momo? Acho que temos tido tão pouco tempo para extravasar
as nossas emoções, de termos nossas catarses felizes coletivas, de sorrir e
festejar com alguém simplesmente por uma alegria desinteressada... O Carnaval
consegue representar tudo isso para a grande maioria e cumprir a sua missão. Bola dentro pra você.
Vejo também alguns amigos pedindo para ser Carnaval todo dia
ou pelo menos várias vezes ao ano. Tenho a certeza de que a graça enxergada na
sua folia, Momo, vem justamente do fato de ela ser extaodinária e fugaz. Se
Carnaval fosse rotina, iríamos esperar ávidos pela Quarta-Feira de Cinzas. O
ser humano é assim mesmo...
Como sou geminiano e, como bom geminiano, sei ser dúbio, adoro
assistir às Escolas de Samba. Inclusive na próxima sexta vou à Sapucaí ver o
Grupo de Acesso depois de ter me afastado nos últimos dois anos. E gosto sim de
encontrar meus amigos pela rua para, juntos, aproveitarmos essas microférias
que o calendário brasileiro nos proporciona. Acho bacana as fantasias também e
esse ano poderei ser visto pelas ruas de mágico, egípcio e de banhista; sempre
junto dos meus amigos ou ao menos do meu companheiro, fazendo alguma gracinha
com nossos respectivos trajes.
Agora, Momo, tenho outra confissão a fazer: não suporto a
ideia de me vestir de mulher, como tantos amam durante o período. Deve ser
algum trauma de infância, mas simplesmente não consigo. E olha que ultimamente
tenho buscado cada vez mais entender sobre ideologia de gênero, sobre liberdades
individuais, sobre como a divisão do mundo entre azul e rosa é ultrapassada...
Porém, não me desce a ideia de ser eu a me vestir de mulher e até julgo um bocado internamente
quem só usa roupa feminina no Carnaval para fazer graça, e não por um reconhecimento de
personalidade. É, eu sei... Foi mal aí. Espero não te decepcionar por isso.
Até tentei me desafiar nesse sentido: escrevi um conto em primeira pessoa, que se passa num carnaval e tem como protagonista e narrador um folião que se veste de bailarina. Olha que esforço da minha parte! Se esforça um cadinho aí também, vai...
Enfim, Momo, seu reinado está chegando. Viveremos dias
intensos pela frente. Que tal selarmos as pazes e termos uma bela convivência? Por
quatro diazinhos. Cinco, contando que sexta já tem Sapucaí. Tá, cinco e meio,
porque tem a Quarta-Feira de Cinzas. Ou nove, porque agora tem bloco até no fim
de semana seguinte...
Pensando bem, tá dificíl te defender, hein... Começa cedo,
demora pra ir embora... Quando é que começa a ter ovo de Páscoa nas Lojas
Americanas mesmo?!
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Paulo Henrique Brazão, nosso colunista oficial das quartas-feiras, é niteroiense, jornalista e autor dos livros Desilusões, Devaneios e Outras Sentimentalidades e Perversão. Recém chegado à casa dos 30 anos, não abre mão de uma boa conversa e da companhia dos bons amigos.
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