Retornavam à velha casa de praia após cinco anos. Restavam apenas escombros. A areia havia invadido tudo; sinais de que o mar avançara sobre as paredes e levado boa parte da estrutura eram evidentes. Sobravam apenas alguns pilares, restolhos de paredes e o telhado, capenga, no estilo cabana, que o vento incessante parecia poder levar a qualquer momento.
Ele se aproximou da estrutura, retirou os óculos escuros e falou, um bocado abismado:
- Uau. Bem que o Bil avisou, mas não tinha ideia de que estava assim.
Parecia totalmente deslocado do ambiente. Tinha uma roupa social, sapatos e um blazer que o vento também parecia querer carregar.
Ela estava mais condizente, num vestido floral predominantemente na cor coral. Os cabelos esvoaçantes tapavam-lhe a cara por vez ou outra. Parecia mais emotiva em ver a cena.
Andaram até a estrutura da casa onde ainda era possível entrar, os fundos, onde se encontrava a cozinha. Não havia praticamente nenhum piso mais à mostra; tudo era areia e cascalhos.
- Não tem mais valor nenhum esse imóvel. Melhor demolir. – disse ele.
- Por quê? – questionou ela.
- Por que o quê, Bela?
- Por que você é assim? Só consegue ver valor nas coisas quando elas têm preço.
- Ah, faça-me o favor com esse seu discurso, Isabela... A gente veio resolver a questão da casa de praia, que era o único ponto pendente do nosso divórcio. Se você não está preocupada com dinheiro, então não pede metade das coisas e nem pensão.
Ela virou-se para o lado, sem responder o ex-marido. Viu na parede ainda um quadro com algumas palavras que diziam sobre família, risos, verdade e serem felizes. Achou irônico:
- Quando foi que tudo ruiu, hein, Luiz?
- Pelo que o Bil falou, tem pelo menos dois anos. A gente abandonou isso aqui...
- Não, digo da nossa relação. Quando foi que tudo ruiu?
Ele se virou para ela e deu um risinho:
- Não aguento falar mais sobre isso com você, Isabela... Nós já estamos conversados...
- Quando foi que essas palavras deixaram de fazer sentido? – e apontou para o penduricalho na parede, sujo com a ação do tempo.
- Isabela, isso é só um quadro.
Foi a vez dela rir. Mas era um riso triste. Isabela não tinha um pingo de alegria dentro de si e ser feliz parecia uma missão muito distante na vida dela. Sacou o quadro da parede, limpou levemente com as mãos e colocou dentro da bolsa.
- Não sabia que você era tão apegada a esse quadro. – falou Luiz.
- Não sou. Sou apegada ao significado.
Ela saiu da casa e se afastou o suficiente para vê-la por completo, destruída. As palmeiras próximas também se dobravam com o forte vento que vinha do mar. A maré subia e parecia que poderia chegar ao que restou do imóvel em poucos minutos.
Tudo o que Isabela queria, naquele momento, era ver aquilo tudo ir embora, levado pelas águas. Mas sabia que levaria anos até que isso de fato terminasse...
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Paulo Henrique Brazão, nosso colunista oficial das quartas-feiras, é niteroiense, jornalista e autor dos livros Desilusões, Devaneios e Outras Sentimentalidades e Perversão. Recém chegado à casa dos 30 anos, não abre mão de uma boa conversa e da companhia dos bons amigos.
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